O caminho para a qualidade e a transparência das demonstrações financeiras

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Normas contábeis internacionais, regulamentações nacionais e tecnologia influenciaram drasticamente à preparação dos relatórios contábeis

Na atual “Era do Conhecimento”, a informação transformou-se no grande ativo da sociedade e, consequentemente, das organizações. Neste contexto, mais que uma obrigação legal, as demonstrações contábeis e financeiras podem ser consideradas poderosos instrumentos de gestão, que facilitam a tomada de decisão segura e assertiva e ainda evitam riscos e prejuízos, trazem confiabilidade, permitem o monitoramento de investimentos e dos resultados e conferem transparência ao relacionamento da empresa com os seus diversos stakeholders. Informações relativas à saúde financeira da empresa, solidez, tendências e perspectivas diversas do negócio só podem ser acessadas com clareza e transparência a partir desses documentos.

Dessa forma, pensando em um mundo globalizado e conectado, ao fornecer informações sobre as situações econômicas, patrimoniais e financeiras, esses demonstrativos viabilizam a adaptação e o alinhamento de uma organização com seus colaboradores, clientes, sócios, fornecedores, investidores, bancos e governos.

Como a ciência da riqueza, atrelada aos movimentos e transformações mercantis da sociedade, a contabilidade vem se transformando ao longo do tempo. Com a multiplicação de players, como os acionistas, os administradores, os funcionários, os clientes e os investidores, surgiu a necessidade do aperfeiçoamento dos demonstrativos para atender a todos eles e especialmente à prosperidade social. Nos últimos 25 anos, que o Troféu Transparência vem destacando as demonstrações financeiras mais transparentes, alguns dos acontecimentos ocorridos no Brasil e no mundo foram decisivos para a evolução da relevância, a qualidade e a credibilidade das informações contábeis e financeiras.

Lei das Sociedades Anônimas

A apresentação dos dados financeiros no Brasil para empresas que possuem acionistas é exigida a partir da Lei 6.404/76 com o detalhamento dos resultados de faturamento, lucro bruto e líquido, despesas e investimentos feitos no ano, podendo variar, dependendo da classificação tributária da empresa. Trata-se de uma legislação que é considerada um divisor de águas na contabilidade brasileira, com a normatização de procedimentos contábeis e da adoção de disciplinas das companhias abertas.

A Lei foi uma resposta à necessidade de criação de uma estrutura jurídica no país para o fortalecimento do mercado de capitais de risco e o incentivo às empresas privadas na economia brasileira. Por ela, tornaram-se obrigatórios o Balanço Patrimonial, a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE), a Demonstração dos Lucros ou Prejuízos Acumulados (DLPA); a Demonstração de Fluxo de Caixa (DFC); a Demonstração de Valor Adicionado (DVA); e as Notas Explicativas.

Juntamente a outros atos normativos do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e da Comissão de Valores Imobiliários (CVM), a Lei das SAs norteia a prática contábil para esse tipo de sociedade.

Ao lado da 6.404/76, as Leis 11.638/07 e 11.941/09 vieram para trazer padronização dos dados contábeis e, consequentemente, tornar mais claro, compreensível e transparente o conteúdo dessas informações.

Escândalos contábeis e a Lei Sarbanes-Oxley

Nos primeiros anos do novo milênio, alguns escândalos corporativos em empresas americanas como WorldCom, Xerox, Tyco e especialmente a Enron, que propiciou ainda a queda de uma gigante de auditoria: a Arthur Andersen, assustaram o mundo e abalaram a confiança dos investidores sobre a veracidade das demonstrações financeiras.

Em resposta a esse movimento de sucessivas fraudes financeiras, os Estados Unidos criaram, em 2002, a Lei Sarbanes-Oxley, conhecida como SOx ou Sarbox, considerada a mais ampla reforma do mercado de capitais norte-americano desde a sua regulação, após a crise de 1929. Até então, o United States Securities Act de 1933 regulamentava o mercado de ações.

A SOX proibiu os auditores de fazerem trabalhos de consultoria para seus clientes auditados, o que evitou o conflito de interesses que levou à fraude da Enron. Seus principais objetivos eram proteger investidores e outros stakeholders de erros das escriturações contábeis, combater e prevenir fraudes, aprimorar a governança corporativa e a prestação de contas, imprimir qualidade e credibilidade às informações e trazer sustentabilidade às organizações.

A lei regulamentou as funções financeiras de contabilidade e auditoria e propôs penalizar severamente os crimes corporativos e de colarinho branco contra todas as entidades listadas na bolsa de valores dos Estados. A SOX criou novas regras para contadores, auditores e diretores corporativos, bem como impôs requisitos mais rigorosos de manutenção de registros e estabeleceu um padrão para relatórios de auditoria. Além de promover a melhora da qualidade das informações financeiras, com base em normas contábeis, controle interno, governança corporativa, independência de auditoria e aumento das penas para crimes financeiros.

Esses eventos e a promulgação dessa lei repercutiram em todo o mundo e, a partir daí, o tratamento das demonstrações foi reavaliado e novas posturas foram sendo tomadas.

IASB e IFRS

Em 2001, houve a alteração de IASC (International Accounting Standards Committee), criado em 1973, para IASB (International Accounting Standards Board), que se propôs formular e divulgar normas contábeis para as demonstrações contábeis, atuando com a comunidade internacional para tornar os novos parâmetros aceitáveis em grande parte das empresas do mundo. Desde então, o órgão vem buscando se tornar o normalizador da contabilidade global.

Com a mudança no nome, as IAS (International Accounting Standards) começaram a ser substituídas pelas IFRS (International Financial Reporting Standards)
para padronizar a publicação das demonstrações financeiras.

O principal movimento e mobilização internacional para a adoção de um padrão único de contabilidade no mundo veio da Europa, principalmente após os escândalos nos Estados Unidos e o consequente enfraquecimento do USGAAP (Generally Accepted Accounting Principles), modelo adotado pelos Estados Unidos regulamentado pelo FASB (Financial Accounting Standards Board).

Atualmente, as IFRs são utilizadas por empresas no mundo inteiro, umas mais outras menos. No Brasil, acredita-se que cerca de 90% das demonstrações publicadas utilizam esse modelo. Certamente, o grande impulso das IFRs se deu pela União Europeia em 2003 requerendo que as demonstrações financeiras consolidadas publicadas pelas empresas listadas no velho mundo seguissem o padrão das IFRs a partir de 2005.

Assim como outros países o Brasil acompanhou a convergência com as normas IFRs com exigências trazidas pelo Banco Central do Brasil e pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), valendo destaque à publicação da Lei 11.638/07, que culminou com a oficialização do CPC (Comitê de Pronunciamentos Contábeis), órgão este que se dedica ao desenvolvimento de padrões contábeis em alta medida convergidos com as IFRs.

O CPC dividiu a emissão de pronunciamentos em duas principais partes: 14 normas e 2 orientações emitidas em 2008, e o restante sendo emitido a partir de 2009. As empresas brasileiras, ou instaladas no Brasil, adotaram as primeiras normas e orientações em 31 de dezembro de 2008, e o restante destas somente para o exercício findo em 31 de dezembro de 2010. A convergência se deu entre 2011 e 2013. Sendo que em 2010 uma pesquisa da CVM apontou que 92% das empresas listadas já haviam aderido aos padrões internacionais.

O Troféu Transparência acompanhou essas mudanças, apontou e avaliou as demonstrações que naqueles anos começaram a adotar as IFRS.

Surgimento do CPC

Com a crescente relevância da convergência do padrão contábil do Brasil ao internacional, possibilitado após as Leis 11.638/07 e 11.941/09, em âmbito nacional, coube ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) a responsabilidade de emitir pronunciamentos contábeis conforme o International Financial Reporting Standard (IFRS), as chamadas normas internacionais de contabilidade.

Criado em 2005, pela Resolução CFC 1.055/05, o CPC tem como finalidade o “o estudo, o preparo e a emissão de documentos técnicos sobre procedimentos de contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, visando à centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da contabilidade brasileira aos padrões internacionais”.

O CPC é composto por entidades como Associação Brasileira das Companhias Abertas (ABRASCA); Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (APIMEC); Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBOVESPA); Conselho Federal de Contabilidade (CFC); Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (IBRACON) e Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (FIPECAFI).

O comitê recebe a incumbência de estudar e preparar a emissão de Pronunciamentos Técnicos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, visando à centralização e à uniformização do seu processo de produção, levando sempre a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais. Atualmente, existem cerca de 50 CPCs editados, contemplando diversos assuntos da contabilidade.

A chegada da Lei 11.638/07

Em 2007, com a finalidade de tornar claras e simples as informações das demonstrações para os diversos usuários e colocar o Brasil no patamar internacional, outra legislação trouxe impactos expressivos: a Lei 11.638, outra grande transformação na contabilidade.

Essa legislação deu a largada no Brasil à convergência e harmonização às normas internacionais de contabilidade, viabilizando a adesão dos conceitos instituídos pelo IFRS e originando uma série de mudanças à Lei das S.As, como a troca da exigibilidade da Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR) pela Demonstração de Fluxo de Caixa (DFC); a inserção da Demonstração do Valor Adicionado (DVA(; reestruturação do Balanço Patrimonial, alteração da base de expedição de normas contábeis da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que passou a Normas Internacionais de Contabilidade, alinhadas ao principais mercados de valores mobiliários.

Tudo isso proporcionou uma mudança de mindset sobre a área contábil no Brasil, com mudanças de posturas dos profissionais, formas de pensar a contabilidade e também de cuidado com as demonstrações contábeis e financeiras.

As demonstrações e a tecnologia

O grande marco tecnológico da área fiscal brasileira e do relacionamento fisco-contribuinte no Brasil veio em 2007, com a implantação do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), que permitiu a modernização da sistemática do cumprimento das obrigações acessórias às administrações tributárias e aos órgãos fiscalizadores, promoveu a melhoria do ambiente de negócios no país e trouxe diversos outros benefícios como viabilizar o compartilhamento de informações e a análise mais confiável das demonstrações contábeis.

Com o tempo, o SPED passou a ser também um instrumento de apoio às tomadas de decisões e de melhoria do relacionamento com os stakeholders da empresa, ou seja, veio ao encontro com uma das principais premissas das demonstrações financeiras e contábeis.  Muito além do Fisco, por meio da Escrituração Contábil Digital (ECD), um dos braços do SPED, a relação da organização com clientes, fornecedores, investidores e outros ganhou mais segurança e credibilidade.

Inteligência dos números e das pessoas

Antes vista como uma área burocrática, aos poucos a contabilidade conquistou novos espaços e hoje é percebida como altamente tecnológica e estratégica. A contabilidade e a tecnologia hoje estão intrinsecamente ligadas e esse cenário vem transformando a atividade, com a substituição de processos manuais e repetitivos, por processos informatizados e inteligentes que trazem agilidade, produtividade, otimização e redução de custos.

Nessa esteira, as empresas elevaram seus investimentos em ferramentas e softwares de gestão e em compliance, visando o aumento da eficiência, o mapeamento de riscos, o tracejo de indicadores gerenciais e o aprimoramento do processo decisório. Isso, sem desconsiderar a grande diferença de porte, de faturamento e de capacidade das empresas brasileiras, tendo em vista que esse cenário ainda está distante para uma parcela expressiva de organizações.

Por muito tempo, os relatórios e as demonstrações contábeis e financeiras foram vistos como itens altamente técnicos e burocráticos. Mas nesse contexto de avanço tecnológico, o registro dos fatos pode ser realizado de maneira mais segura, confiável, rápida e de forma integrada, o que auxiliou de sobremaneira as tomadas de decisões. Com a globalização, a popularização da internet e a transformação digital, hoje é possível, além de informação melhor apurada, a geração de relatórios quase que em tempo real, de forma precisa, o que tem revolucionado esse ambiente corporativo.

Essa jornada tem sido desafiadora para a contabilidade, exigindo mudança de mindset, de cultura corporativa, de relacionamentos e de gestão. Já se ultrapassou muitas barreiras, mas o caminho ainda é longo. Hoje, é fundamental utilizar tecnologias como automação, inteligência artificial, internet das coisas, análise de dados, e tantas outras que vêm conquistando importância vital para valorizar ainda mais a informação contábil como instrumento de gestão à tomada de decisão e a sua transformação efetiva em valor.

Sem esquecer que além disso, de responsabilidade dos contadores no passado, a demonstração financeira atualmente é uma responsabilidade compartilhada por várias áreas. As normas existentes e os processos fizeram com que novos especialistas fossem inclusos neste processo. A contabilidade pode estar na liderança, mas o preparo passa por toda a companhia.

A elaboração dos relatórios contábeis e financeiros tem ciclos que passa pelo dia a dia da operação, pelo contexto do negócio, pelo planejamento e por um cronograma pré-estabelecido. Todo esse ambiente de preparação evoluiu muito ao longo dos anos. A chegada do IFRS trouxe um nível de especialização diferenciado que exige conhecimento de outras áreas. Já os aspectos regulatórios no Brasil trouxeram, ainda, responsabilidades ampliadas, como é o caso da diretoria estatutária, que responde pelo que é divulgado.

A demonstração financeira é peça individual de cada entidade. Desde o CPC 07, passaram a ter uma qualidade melhor. A empresa que consegue trazer a melhor informação ao mercado tem mais sucesso e a tecnologia e as equipes multidisciplinares têm sido um grande alinhado nesse sentido.

O reconhecimento da transparência

Todas essas mudanças e legislações mencionadas, além de muitas outras, colocaram a transparência como item prioritário no atual universo corporativo contemporâneo e como questão chave para o sucesso dos negócios. É por ela que as organizações conquistam a confiança do mercado e de todos os seus stakeholders, sejam eles gestores, sócios, colaboradores, fornecedores, e especialmente investidores e consumidores, que a cada dia têm mais informações sobre o produto ou o serviço que consomem ou a qual se aliam.

Ciente dessa relevância desde o seu nascimento, há quase 55 anos, a ANEFAC sempre prezou pela qualidade, confiabilidade e efetividade das demonstrações contábeis e financeiras e foi isso que a motivou a criar, em 1997, o Troféu Transparência – Prêmio ANEFAC-FIPECAFI.  A busca pela  transparência nas demonstrações financeiras está no DNA da entidade

Há mais de 25 anos, portanto, a premiação vem cumprindo o seu propósito de estimular a transparência, de reconhecer as companhias que divulgam ao mercado as melhores e mais claras informações financeiras, além de contribuir para a construção de uma sociedade mais forte, segura, ética, confiável e próspera.

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